sábado, 29 de junho de 2013

492. A CIDADE BRANCA DO CUME





tarde comecei a escrever versos
uma cepa de maus poemas entrelaçados nas videiras bravas do sem-sentido     uma merda eu sei
já os havia escrito nos cabos emaranhados do cais do esquecimento letárgico 
das pedras gastas do ancoradouro norte 
esses
nem bons nem maus
dos quais não me recordo do mesmo modo que a sé catedral não relembra as promessas angustiadas dos aflitos inscritas nos altares e santos gastos por orações douradas

escrevia-os e lia-os 
enquanto tu no teu distendido pêlo fulvo interrompias vivaldi para os ouvir
os teus olhos iluminados desaprovavam a dissonância de grande parte das frases encadeadas num arremesso
outras brilhavam nos teus olhos luzeiros de universo
olhos compassivos sem mágoa 

adormecias ao som das quimeras ditas num sopro
das viagens reais e ilusórias da minha criação polvilhada em múltiplos seres     nunca soube ser um só
e tal criança brincavas infantilmente com as imagens 
das garatujas
ficando o meu mais profundo ser
a velar por ti horas infindáveis de espanto

qualquer movimento teu era uma palavra redonda perfeita
qualquer olhar nocturno um canto à fé dum mundo-sem-esperança
a elegia do olhar vagabundeava na nossa cabana com vista prateada para o rio verde-esmeralda que nunca conseguiste ver

dia noite noites dias meses contigo a olhar 
reprovando as lágrimas ensanguentadas do momento pontiagudo do desespero
porque a paz já nascera nas paredes encantadas do mais rico dos palácios
a cidade magnífica do amor estava aos nossos pés 
poço de água pura inesgotável

apenas te vi chorar uma vez eu que tantas chorei e senti a fraqueza duma qualquer erva a vibrar no caminho
partias para o reino da morte e eu verdugo havia indeciso assinado o veredicto
pedi-te 
não chores
uma parte da minha alma vai contigo
a outra saberá onde te encontrar

quando juntos entrarmos vitoriosos na cidade branca do cume


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