a curva da estrada
apesar do quebranto
algo me impele a estancar
há sombras vivas
que repousam no asfalto
árvores retorcidas
que já deram o seu fruto
vinhedos esquecidos
o sol brilha através dos ramos dos pinheiros bravos
um lavrador come a merenda à sombra de uma fraga
a mulher prepara estacas
o semeador descansa e bebe
o vinho com a frescura da água da mina
ao seu lado
pão de centeio
queijo
um naco de presunto velho
sorri
o seu sorriso arrasta-me pela memória dos tempos
o seu sorriso é rosa-do-mundo
vejo-me nos calções azuis cor de céu e na alva branca de domingo
há missa
os sinos tocam
casimiro casmiro casmirito mirito miro
o meu amigo-louco
da infância perdida
miro
o louco
do sorriso infinito
aberto
livre
ingénuo
contagiante
que ia à igreja só para me ver ler
sinto saudades
não sei se da vida
se da morte
se do mal
se do bem
sinto saudades
e sentir saudades
é ter feridas
sangrantes
mas sempre é melhor
ter saudades
que não ter nada
sento-me no muro em pedra circular
vejo um vulto no chão
(eu que desde criança vejo coisas
coisas que não devia ver)
foi aqui que miro veio morrer
Sem comentários:
Enviar um comentário