dias de ignorância o sem sentido
as horas correm pela noite sal dos himalaias que se alumia
estado de letargia sem sono
lume brando da existência sonora
a insipiência é mensurável pelo pesadume da experiência
traquejo do sofrimento
negação de calendário licencioso com perfis nus
lá fora o sol incinera a sarça
a traça apodera-se do velho sermão
cá dentro a alma em queimação
quem sou eu?
haverá um falso eu
haverá um eu verdadeiro
pássaro ferido arrojado aos pés de camélias brancas
espírito alado varado pela dúvida
ânimo acorrentado prisioneiro do destino
beatitude da mais pujante soledade
levante de noite escura
quem sou eu?
o mês das giestas já poisou nas mãos mortas da indigência quotidiana
as urgueiras brotam desejos
os pinheirais estão mudos
os relvões do cume fanados
corpo consciência intelecto
quando vigio quando no sono sonho
e quando durmo profundamente na morte do entendimento
o que é que tem subsistência?
sou este corpo mundo de órgãos e morada de biliões de seres que o habitam servem matam e são mortos
sou o que como o que desenfezo o que defeco o sémen que derramo nas horas de luxúria
suor de tardes violentas
calafrio de intempéries ancestrais
sincelo que na carne se entranha e os ossos rói
corpo que dói
quem sou eu?
a percepção da realidade e do sonho a brotarem dum corpo que se abastarda dia-a-dia
o percebimento da orbe pelos sentidos
sonhei ser borboleta ou sou agora uma mariposa que sonha ser um homem?
quem sou eu?
o ego os pensamentos aí engendrados no sonho do sono e na insonolência
esse misérrimo eu criador de todas as iniquidades
serei corpo consciência intelecto
e no sono profundo estado sem dualidade
onde não há eu tu terra lua sol firmamento
anseio medo ambição
ganância ira maldade sofrimento
onde os próprios sonhos se suprimem
e corpo consciência e razão não existem
quem serei eu?
música de fundo perfeição progressiva nos acordes
vozes
algo se nega
luz contida
nas sebes da alma
no plexo solar uma pressão interna alma em esforço ao luar flor que se quer mas não pode abrir observo-te reservatório da vida
nem candeia nem lanterna
não vens
o teu desprezo é circunciso
cortas-me o freio
e não me diluis o desejo
a minha visão é interna lenta a descida do olhar
um fio de luz transporta orvalho do coração ao ventre
o corpo presente em sacarina letargia
algo que se comunica a pressão continua
o escondido não se mostra
agita-se em espaço comprimido região umbilical em quase-explosão
é urgente
paciência
persistência
quem sou eu?
quem és tu a quem nego a saída?
pergunto-me de novo
quem sou eu?
este corpo a consciência que tenho na vigília ou no sonho a intelecção
não eu sou eu presente na vigília no sonho e no sono profundo
dormirei profundamente e saberei que estando surdo cego e mudo terei o mundo
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