segunda-feira, 24 de junho de 2013

346. ENTERRO FEITO CASO ENCERRADO





gostaria de saber escrever quadras como aquele doente
que de tão enfastiado mata o tempo no hospital
enquanto de branco aquela gente o vai matando

de ser poético     belo figurão e bem falante     palrador
dizer em lindo discurso     bom ano passa fome     paciência
bebei água comei pão duro que para nós cama quente e espumante

de ter jeito     aquele jeito especial de enriquecer
à custa do povo demente com a tez a escurecer
e a sorrir dizer-lhe que o trabalho dá saúde e faz a miséria crescer

de mentir como quem fala verdade em falsa jura
e pela verdade mentir e pela mentira asseverar
que em mundo torto andam direitos os asnos irmãos desta irmandade

que tudo é assim que assim tudo está bem
porque deus o quis e deus o quer
e que quem não concordar no pecado que tem vive e há-de morrer

mas
sem tal engenho

o que eu gostava mesmo de ser     por várias razões
se o quereis saber era ser o gato-pingado 
que à cova com gosto levaria todos os ladrões deste estado
certificando-me que enterro feito caso encerrado


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