o tempo some-se nas caves do esquecimento
o lago gela na viagem do homem para a morte
um rapaz transporta erva húmida
apoiada na virginal pele macia
murmuram as fontes junto aos riachos
que à costa dão nas marés de setembro
da gandaia de rosto sulcado por negras vagas
acocoradas nos mouchões da corrente norte
o vento endoidecido não suporta o brilho do sol
reflectido nas pequenas flores das ervas da margem
pudesse eu viver tudo de novo
tudo viveria de novo
o que a terra me deu
o que num último abraço me há-de dar
o relógio que não tenho
da sala que não tenho
bate
há luzes moribundas na abóbada
delírio de despedida e
o coração em chamas sem fumo
bate
o céu vai alto
tão alto tão aéreo
o meu braço não o alcança
vai alto
como a rua em transe
de meu espírito em cruz
vai elevado
o tempo é um lameiro reverdecido e penhorado
às montanhas seminuas
com noite de ossos de estrelas cadentes
o tempo é pureza e loucura
paisagem destruída
daquilo a que chamam vida
nos corredores da morte
vou-me
não sei para onde
vou-me
deixando para trás a encruzilhada de néon
vou-me
cavalgando lágrimas e trovões
no vento dividido pelo quadrante da indecisão
refugiado no patíbulo do fazedor de chuvas
desperdiçando dias de amor
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